MARCO ANTONIO VILLA é
historiador e professor da
Universidade Federal de São
Carlos (SP).
Um simples passeio pelo
site permite obter algumas informações preocupantes.
O tribunal tem 160
veículos, dos quais 112 são automóveis e os restantes 48 são vans, furgões e
ônibus. É difícil entender as razões de tantos veículos para um simples
tribunal. Mais estranho é o número de funcionários. São 2.741 efetivos.
Muitos, é inegável. Mas o
número total é maior ainda. Os terceirizados representam 1.018. Desta forma, um
simples tribunal tem 3.759 funcionários, com a média aproximada de mais de uma
centena de trabalhadores por ministro!! Mesmo assim, em um só contrato, sem
licitação, foram destinados quase R$2 milhões para serviço de secretariado.
Não é por falta de recursos
que os processos demoram tantos anos para serem julgados. Dinheiro sobra. Em 2010, a dotação
orçamentária foi de R$940 milhões. O dinheiro foi mal gasto. Só para
comunicação e divulgação institucional foram reservados R$11 milhões, para
assistência médica a dotação foi de R$47 milhões e mais 45 milhões de
auxílio-alimentação. Os funcionários devem viver com muita sede, pois foram
destinados para compra de água mineral R$170 mil. E para reformar uma cozinha
foram gastos R$114 mil. Em um acesso digno de Oswaldo Cruz, o STJ consumiu
R$225 mil em vacinas. À conservação dos jardins — que, presumo, devem estar muito
bem conservados — o tribunal reservou para um simples sistema de irrigação a
módica quantia de R$286 mil.
Se o passeio pelos gastos
do tribunal é aterrador, muito pior é o cenário quando analisamos a folha de
pagamento. O STJ fala em transparência, porém não discrimina o nome dos
ministros e funcionários e seus salários. Só é possível saber que um ministro
ou um funcionário (sem o respectivo nome) recebeu em certo mês um determinado
salário bruto. E só. Mesmo assim, vale muito a pena pesquisar as folhas de
pagamento, mesmo que nem todas, deste ano, estejam disponibilizadas. A média
salarial é muito alta. Entre centenas de funcionários efetivos é muito difícil
encontrar algum que ganhe menos de 5 mil reais.
Mas o que chama
principalmente a atenção, além dos salários, são os ganhos eventuais,
denominação que o tribunal dá para o abono, indenização e antecipação das
férias, a antecipação e a gratificação natalinas, pagamentos retroativos e
serviço extraordinário e substituição. Ganhos rendosos. Em março deste ano um
ministro recebeu, neste item, 169 mil reais. Infelizmente há outros dois que
receberam quase que o triplo: um recebeu R$404 mil; e outro, R$435 mil. Este
último, somando o salário e as vantagens pessoais, auferiu quase meio milhão de
reais em apenas um mês! Os outros dois foram “menos aquinhoados”, um ficou com
R$197 mil e o segundo, com 432 mil. A situação foi muito mais grave em
setembro.
Neste mês, seis ministros
receberam salários astronômicos: variando de R$190 mil a R$228 mil.
Os funcionários (assim como
os ministros) acrescem ao salário (designado, estranhamente, como “remuneração
paradigma”) também as “vantagens eventuais”, além das vantagens pessoais e
outros auxílios (sem esquecer as diárias). Assim, não é incomum um funcionário
receber R$21 mil, como foi o caso do assessor-chefe CJ-3, do ministro 19, os
R$25,8 mil do assessor-chefe CJ-3 do ministro 22, ou, ainda, em setembro, o
assessor chefe CJ-3 do do desembargador 1 recebeu R$39 mil (seria cômico se não
fosse trágico: até parece identificação do seriado “Agente 86” ).
Em meio a estes
privilégios, o STJ deu outros péssimos exemplos. Em 2010, um ministro, Paulo
Medina, foi acusado de vender sentenças judiciais. Foi condenado pelo CNJ.
Imaginou-se que seria preso por ter violado a lei sob a proteção do Estado, o
que é ignóbil. Não, nada disso. A pena foi a aposentadoria compulsória. Passou
a receber R$25 mil. E que pode ser extensiva à viúva como pensão. Em outubro do
mesmo ano, o presidente do STJ, Ari Pargendler, foi denunciado pelo estudante
Marco Paulo dos Santos. O estudante, estagiário no STJ, estava num a fila de um
caixa eletrônico da agência do Banco do Brasil existente naquele tribunal. Na
frente dele estava o presidente do STJ. Pargendler, aos gritos, exigiu que o
rapaz ficasse distante dele, quando já estava aguardando, como todos os outros
clientes, na fila regulamentar. O presidente daquela Corte avançou em direção
ao estudante, arrancou o seu crachá e gritou: “Sou presidente do STJ e você
está demitido. Isso aqui acabou para você.” E cumpriu a ameaça. O estudante,
que dependia do estágio — recebia R$750 —, foi sumariamente demitido.
Certamente o STJ vai
argumentar que todos os gastos e privilégios são legais. E devem ser. Mas são
imorais, dignos de uma república bufa. Os ministros deveriam ter vergonha de
receber 30, 50 ou até 480 mil reais por mês. Na verdade devem achar que é uma
intromissão indevida examinar seus gastos. Muitos, inclusive, podem até usar o
seu poder legal para coagir os críticos. Triste Judiciário. Depois de tanta
luta para o estabelecimento do estado de direito, acabou confundindo
independência com a gastança irresponsável de recursos públicos, e autonomia
com prepotência. Deixou de lado a razão da sua existência: fazer justiça.
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