Investigado,
Renan trama contra investigações
Josias de Souza
A
pretexto de fazer um balanço do semestre legislativo, Renan Calheiros divulgou
um pronunciamento na TV Senado. Na peça, fez autoelogios, trombeteou
prioridades controversas e reiterou ameaças legislativas à Lava Jato. Alvo da
operação, protagonista de inquéritos em série no STF, Renan trama, por exemplo, alterar a lei que regulamenta a delação
premiada. (PROVAVELMENTE ELE NÃO
GOSTARIA DE SER O PRÓXIMO)
Disse Renan:
“Com
a responsabilidade de quem aprovou a delação, devo dizer que, quando a delação
não for comprovada e for vazada para constranger, com o réu preso, com as
contas bloqueadas e a família desesperada, quando for apenas para livrar o
bandido da cadeia, para trocar personagens, contar narrativas mentirosas, citar
fatos que não têm nada a ver, apenas para lavar o dinheiro pilhado, como
algumas delas, evidentemente a pena precisa ser agravada e a delação até
desfeita.”
O presidente
do Senado investe contra a Lava Jato num instante em que a operação começa a
arrombar os salões do PMDB. Nunca a elite empresarial e política esteve tão
ameaçada como agora. Corrupção passou a dar cadeia. O pânico do cárcere solta a
língua dos transgressores. E as colaborações judiciais tonificam as
investigações.
O mandachuva
do Senado reclama também da complacência com as falsas delações. Conversa mole.
Sérgio Moro, o juiz da Lava Jato, anulou os benefícios concedidos a um delator
que mentiu em depoimento sobre o ex-ministro petista José Dirceu. Graças a essa
decisão, voltou para cadeia o empresário e lobista Fernando Moura, condenado a
16 anos e dois meses de prisão.
“Não se trata de tratamento severo,
pois o colaborador que mente, além de comprometer seu acordo, coloca em risco a
integridade da Justiça e a segurança de terceiros que podem ser incriminados
indevidamente”, anotou Moro na sentença. “Considero os seus depoimentos,
portanto, apenas como uma confissão da prática de crimes por ele mesmo.”
Renan voltou
a brandir a espada que mantém sobre a cabeça de Rodrigo Janot, chefe do
Ministério Público Federal. “O Senado recebeu dez pedidos de afastamento do
procurador-geral da República por variadas razões”, afirmou, sem especificar as
alegações. “Eu arquivei
cinco deles, por ineptos. Os demais estou analisando e pedi um parecer da
Advocacia-Geral do Senado. Vamos aguardar a manifestação jurídica e técnica
para decidir, amparados na lei.”
Em seu
pronunciamento, Renan reitera a intenção de levar a voto o projeto que pune o
“abuso de autoridade”. “Em torno desse tema, é normal que assim seja, há mais
malícia do que notícia”, afirmou, como a puxar a orelha da imprensa que o
imprensa. A proposta encontrava-se na gaveta desde 2009. Agora, sob o crivo das
autoridades, Renan avalia que o tema “está maduro para deliberação”. Promete
“votá-lo na segunda semana de agosto.” Sugere até o nome de uma relatora: a
deputada Simone Tebet (PMDB-MS).
Os planos de
Renan foram ao ar nas pegadas de uma palestra do juiz Sérgio Moro na American
University, em Washington, nos Estados Unidos. O magistrado declarou que o
Brasil dispõe de leis anticorrupção modernas e eficientes. O problema está no
trâmite dos processos. Segundo ele, o país não tem tradição de punir crimes do
poder. Moro costuma lembrar que, na Itália, a célebre Operação Mãos Limpas
levou a oligarquia política a alterar a legislação para dificultar o
desbaratamento dos crimes. Corre-se o mesmo risco no Brasil.
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