A fritura de Helena Chagas
Elio Gaspari, O Globo
O comissariado fritou a ministra Helena Chagas. Pela primeira vez em quase um
século, desde que o jornalista Lourival Fontes foi cuidar da imagem de Getúlio
Vargas, o funcionário encarregado da comunicação do Palácio do Planalto caiu por
causa de dinheiro, acusado de não atender aos objetivos políticos do
governo.
A jornalista, com 32 anos de carreira, teve no seu ofício um desempenho muito
superior à média do comissariado petista. Não a fritaram porque divulgou o que
não devia, ou deixou de divulgar o que devia. Muito menos porque suas opiniões
políticas divergiam do governo. Na raiz do mal-estar estavam apenas verbas, o
dinheiro da Viúva.
Seja qual for o governo, sempre haverá alguém reclamando porque não recebe
dele verbas publicitárias proporcionais à fidelidade com que o defende. O
patrono dessa espécie deveria ser o jornalista Alexandre von Baumgarten. Amigo
de generais da ditadura, queria reerguer uma revista falida e buscava no
Planalto perdões de dívidas e verbas publicitárias. Acabou-se em 1982, com uma
bala na cabeça, e deixou um dossiê acusando o Serviço Nacional de Informações
pela sua morte.
Em 2012 a máquina de propaganda do palácio moveu R$ 1,9 bilhão. Esse é o
dinheiro que Brasília promete repassar ao governo do Estado Rio para enfrentar
desastres naturais. Noutra conta, R$ 1,2 bilhão é o total dos financiamentos
brasileiros para obras e serviços em Cuba. Vale lembrar que esse tipo de
munificência não foi inventado pelo PT, nem é exclusivo do governo federal. Ele
apenas inflou-o, pois em 2000 o tucanato torrou R$ 1,2 bilhão.
Em 2012 o Planalto gastou mais em publicidade que a Ambev (R$ 1,6 bilhão),
que vive de vender cervejas e refrigerantes. Com R$ 1,7 bilhão, a Caixa
Econômica (cujas despesas não estão na caixa do Planalto) gastou mais que o
Bradesco e o Itaú, somados.
A conta de R$ 1,9 bilhão expande-se para uma cifra difícil de ser calculada.
Nela entram outras campanhas promocionais, como as de ministérios, empresas
estatais e contratos com agências de relações-públicas que se superpõem às
burocracias do Estado. Num cálculo grosseiro, esse aparelho federal pode custar
até R$ 4 bilhões por ano.
Quando um governo desenvolve a mentalidade do sítio, julgando-se injustiçado
pelos meios de comunicação, a arca torna-se um saco sem fundo, capturada por um
círculo vicioso: se estão contra nós, precisamos ajudar quem nos defende e, se
alguém nos defende, nada mais natural que ajudá-lo.
Num outro estágio, o hierarca federal, estadual ou municipal, seja qual for
seu partido, confunde deliberadamente a divulgação de políticas públicas com a
exaltação de suas próprias atividades (leia-se candidaturas). Como fica feio
fazer isso com o aparelho do Estado, privatizam a ambição política e estatizam
seu custo. Em 2013 o Ministério da Saúde gastou R$ 232 milhões e Alexandre
Padilha disputará o governo de São Paulo.
Pedir que os governos parem de gastar dinheiro com publicidade num ano
eleitoral é um exercício fútil. Precisamente porque este é um ano eleitoral, o
balcão está aberto para candidatos capazes de se comprometer a reduzir
drasticamente esse tipo de despesa. Basta contar ao público quanto seus
antecessores torraram e dizer quanto e como pretendem gastar.
Elio Gaspari é jornalista.
Nenhum comentário :
Postar um comentário