"Precisamos
falar sobre capitalismo"
Socialismo serve para os comandados.
Para quem manda e impõe deveres o que vale é o capitalismo.
Hierarquias e privilégios parecem mais naturais no Brasil
que a igualdade diante da lei e a impessoalidade
No Brasil, pouca
gente sabe definir o que é, mas muitos odeiam o capitalismo.
O Instituto Millenium (ONG
dedicada a promover os valores da liberdade, democracia e economia de mercado),
um dia desses, colocou uma pessoa na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro,
perguntando aos transeuntes o que pensavam sobre o assunto. Três de cada quatro
entrevistados ficaram nervosos com a pergunta, recuavam temerosos do microfone,
ou resmungavam desconfortos variados como “aqui no Brasil não tem isso não”,
“sei não senhora” e que tais.
O restante das respostas,
inclusive de uma professora do ensino médio, refletiu o que se esperaria obter
de uma região outrora conhecida como a “Brizolândia”.
Em um belo livro recentemente
lançado (“Capitalismo: modo de usar”), Fábio Giambiagi concentra esta mesma
mensagem na sua epígrafe, uma fala de Fernando Henrique Cardoso dirigida a
Arminio Fraga antes de sua sabatina no Senado como parte de sua nomeação para a
presidência do Banco Central. Sem pretender precedência, registro apenas que
ouvi este conselho igualzinho nas duas ocasiões em que fui sabatinado. Eis a sabedoria: “o Brasil não gosta do
sistema capitalista. Os congressistas não gostam do capitalismo, os
jornalistas não gostam do capitalismo, os universitários não gostam do
capitalismo”
Como explicar essa estranha
hostilidade ao sistema econômico que
prevalece em todo o planeta, excetuadas algumas comunidades primitivas isoladas
no Caribe e na Ásia, e cujo indiscutível e extraordinário sucesso aniquilou
qualquer concorrência?
Afinal, o capitalismo é o sistema
econômico baseado na propriedade privada, na liberdade de empreender, na letra
da lei, e na centralidade do mercado para estabelecer os preços. Que há de tão
errado com isso?
O fato é que são reveladoras as
respostas ouvidas na Brizolândia.
Em primeiro lugar, destaque-se a
apatia, muito provavelmente incentivada por valores nossos, mal cultivados. Hierarquias e privilégios parecem mais
naturais no Brasil que a igualdade diante da lei e a impessoalidade.
Valores “maiores” parecem prevalecer sobre os da contabilidade ou da
sustentabilidade: os balanços fecham no Palácio, os patrimônios “não têm preço”, prejuízos “não importam” (DESDE QUE O PREJUÍZO SEJA DOS OUTROS), e a criatividade permeia partidas
dobradas. E por fim, o mercado, a meritocracia e a competição, são coisas para
nossos inimigos, pois é o que se passa na “rua” e não na “casa”, como ensina
Roberto DaMatta.
Em segundo lugar, trata-se do sucesso do capitalismo como se houvesse
dúvida sobre isso. O próprio Marx, em seu famoso manifesto, em 1848, as
eliminou ao afirmar que “a burguesia, em seu reinado de
apenas um século, gerou um poder de produção mais massivo e colossal do que
todas as gerações anteriores reunidas”. O erro estava em prever o
colapso do sistema, ou exagerar nos efeitos colaterais.
Sobre desigualdade, é preciso
cuidado com um sofisma muito comum. O progresso material não é igual em
diferentes regiões do planeta, ou mesmo dentro de um país. Muitas regiões do continente africano vivem hoje do mesmo jeito que
viviam há 500 anos, e nessa ocasião os nativos da região hoje conhecida
como a Califórnia estavam nesta mesma faixa de renda. Em nossos dias, diante da
brutal diferença de bem-estar entre essas regiões pode-se distinguir ao menos
dois tipos de reações: de um lado, os que se encantam com o desenvolvimento
californiano e procuram emular seus valores, e, de outro, os que afirmam que esses 500 anos de capitalismo aprofundaram a
desigualdade (fato estatístico indiscutível, eis que uma das regiões
simplesmente ficou estacionada) ou que, um tanto mais canhestramente, os
californianos ficaram ricos explorando os africanos, ou os mexicanos. Ou seja,
o vilão é quem deu certo, e o sucesso é sempre pecaminoso, segundo a
Brizolândia.
O fato é que, contrariamente aos
países onde as virtudes burguesas — empreendedorismo, parcimônia, iniciativa e
integridade — são louvadas, nosso capitalismo meio patrimonialista sempre foi
visto como um jogo de cartas marcadas, onde os valores a cultivar eram outros: conexões
com o governo, imprevidência, reservas de mercado e malandragem.
Um “capitalismo pela metade” pode
produzir um sucesso pela metade (ou um “meio fracasso”, um país eternamente do
futuro), com distorções imensas, como ocorreu no Brasil dos anos 1980, e mesmo
um retrocesso, como na Argentina. As nações podem simplesmente fracassar.
Em um famoso discurso no Senado
em junho de 1989, o senador Mário Covas, um homem de centro-esquerda e
inatacáveis credenciais nacionalistas, proclamou que o Brasil precisava de um
“choque de capitalismo”. Era um desabafo a propósito da democracia que ele tanto
lutara para reconstruir, e que vivia, naquele mês, uma inflação de 28,6%. A democracia não deveria levar o país à
insensatez econômica. Covas disputava a presidência, e no primeiro turno obteve
apenas 11,5% dos votos, ficando em quarto lugar. Em dezembro, quando ocorreu o
segundo turno, a inflação rompeu oficialmente a barreira da hiperinflação:
51,5% naquele mês.
Covas estava correto em que havia
algo de muito errado nesse nosso “anticapitalismo” patológico e fora de época,
mas o paciente não estava convencido do tratamento. Ainda era forte a demanda por
mágica.
Diversos choques se seguiram, mas
o de capitalismo só avançou mesmo com o “não choque” representado pelo Plano
Real e suas reformas: privatização, responsabilidade fiscal, abertura e as
outras que, em seu conjunto, trouxeram a inflação brasileira para níveis de
primeiro mundo. Quem poderia imaginar
que o sucesso do Plano Real seria o resultado de reformas com o intuito
declarado de fazer do Brasil uma economia de mercado por inteiro?
Não obstante, as reformas
enfrentaram enorme resistência, esta é a maldição da Brizolândia: uma minoria
de perdedores do processo de modernização é sempre capaz de bloquear o que é
novo, pois a maioria beneficiada permanece mergulhada na apatia. Os ganhos são
dispersos, e os custos concentrados em minorias despojadas de seus privilégios,
o velho problema das reformas, e a razão pela qual elas são implementadas por
estadistas e não por “gerentonas” ou líderes populistas.
É caprichosa a História, que organiza
uma volta ao passado pela ascensão de um
líder operário, a quem coube interromper o avanço do capitalismo no Brasil
antes que começasse a modernizar demais as coisas. O Brasil mergulha num
conservadorismo metido a progressista, cuidadoso e inercial no início, mas
que adquire uma feição mais concreta já mais perto de 2008, quando entramos para valer num capitalismo
companheiro, ou de quadrilhas e boquinhas.
Não é a inflação que explode, mas a corrupção, uma outra expressão
para o fracasso desse capitalismo “pela
metade” sobre o qual não vale a pena gastar nem dois tostões de sociologia.
Que o digam Joaquim Barbosa e Sergio Moro. Bobos
fomos nós em levar a sério a “nova matriz” e outras ridículas vestimentas
heterodoxas de que se serviu o cronismo caudilhesco que aqui se implantou. Não
era keynesianismo, nem estruturalismo, mas apenas desonestidade, inclusive
intelectual.
Alguém pode não fazer nada e nem produzir algo,
mas não viverá sem dinheiro, nem que seja dos outros.
CAPITALISMO - SIGNIFICADO: O capitalismo é um sistema econômico em que os meios de
produção, distribuição, decisões sobre oferta, demanda, preço e investimentos
são em grande parte ou totalmente de propriedade privada e com fins lucrativos
e não são feitos pelo governo. Os
lucros são distribuídos para os proprietários que investem em empresas.
Predomina o trabalho assalariado. É dominante no mundo ocidental desde o final
do feudalismo. O termo capitalismo foi
criado e utilizado por socialistas e anarquistas (Karl Marx, Proudhon, Sombart)
no final do século XIX e no início do século XX, para identificar o sistema
político-econômico existente na sociedade ocidental quando se referiam a ele em
suas críticas, porém, o nome dado pelos idealizadores do sistema político-econômico
ocidental, os britânicos John Locke e Adam Smith, dentre outros, já desde o
início do século XIX, é liberalismo.
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