Em seu escritório, na sede do sindicato
dos empregadores domésticos do
Estado de São Paulo, Margareth Carbinato balança a cabeça a cada cena em que
Jéssica enfrenta os patrões da mãe, a empregada Val, interpretada por Regina
Casé no filme "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert.
Jéssica senta na cama do quarto de
hóspede, testando o colchão. "Ninguém dorme aqui?". Na exibição do
longa, acompanhada pela sãopaulo, o olhar de Margareth é de reprovação.
"Não é porque o doméstico reside na casa que vai poder tomar certas
liberdades como se fosse um hóspede. "
Presidente de honra e fundadora do
sindicato, ela diz que "está faltando
no ser humano cada um saber o seu lugar" e critica o que considera
falta de profissionalismo das domésticas.
Rodrigo Dionisio/Folhapress
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Margareth Carbinato, presidente do Sindicato dos Empregadores
Domésticos do Estado de São Paulo
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sãopaulo - O filme é factível? Gostou?
Margareth Carbinato - Não é comum patrão
acolher parentes de empregada. Acho que quem escreveu o filme quis dar uma
conotação do patrão querendo se impor, mas não quero acreditar nisso, porque na casa o dono deve colocar a ordem. A
[Regina] Casé estava maravilhosa, fez o papel de uma empregada consciente. Se sentiu oprimida pelas atitudes da filha.
Houve um "abuso" da menina. Gostei do papel da patroa porque ela foi
até onde suportou e não ofendeu. Não aprendi muita coisa com o filme e acho que
você tem que extrair uma mensagem. Não entendi a mensagem. SE O PATRÃO NÃO DEVE QUERER SE IMPOR, PORQUE , ENTÃO, ELE DEVE COLOCAR ORDENS DENTRO DE SUA RESIDÊNCIA?
Os empregadores se colocam no lugar da
patroa no filme?
É muito fácil você criticar. A Bárbara
não tem nada de vilã. Coloque-se no
lugar dela, absorva o que aconteceu com ela, na casa dela, para depois
falar alguma coisa. Ninguém, em sã consciência, gostaria de ter uma
situação dessa na própria casa. COMO NÃO VI O FILME, NEM PRETENDO VER, NÃO SEI O QUE ACONTECEU NA CASA DA PATROA, MAS POSSO IMAGINAR.
Do que os patrões costumam reclamar no
sindicato?
A queixa é a seguinte: tem empregado
que desaparece do emprego e entra na Justiça falando que o patrão mandou
embora. O empregador ainda não assimilou
a relação empregatícia. Não toma cuidado em ter a documentação do empregado
e depois não sabe como fazer. O empregador tem que se conscientizar de que
precisa ter os documentos porque a realidade é outra, não é mais aquela relação
que anos atrás era mais próxima.
O que mudou no comportamento?
Tem um ditado que diz "quem nunca comeu
mingau, quando come se lambuza". Tenho medo de como caminhará em
uns anos, porque hoje ninguém respeita
ninguém, todo mundo quer tirar proveito.
Não há mais consciência de direitos?
Não sou fã desse discurso porque existem profissões que não tem os direitos
que os domésticos conquistaram
QUAIS SERIAM, OU SÃO, AS PROFISSÕES CITADAS? Agora, não sei como poderia falar, porque não sou
da época da escravatura. Quando nasci não existia empregado com bola no pé nem
pelourinho. Então resquício de escravatura, como dizem...não é resquício de
coisa alguma, é falta de educação. Não é porque conquistei um direito que vou
chegar para o patrão e dizer: "seu tonto, agora quero meus direitos".
Ele vai dar, não precisa agredir.
O que faz uma boa empregada?
O respeito
mútuo é fundamental em todas as áreas. Eu, como advogada, não vou entrar
numa sala de audiência sem pedir licença. Princípios básicos que não precisam
ser ditos. É respeito. Essa palavra precisa fazer parte do dia a dia. Então,
acho que o que está faltando no ser humano é cada um saber o seu lugar. Você
tem direitos, respeite o meu.
E a desigualdade no Brasil?
Meu amor,
desigualdade...A única desigualdade que vi até agora foi um absurdo que tomei
conhecimento. Uma família que tem um hotel no centro da cidade, paga IPTU e,
como estavam querendo vender o hotel e é difícil de vender, o local foi
invadido pelos sem terra, os sem teto da vida. Quatrocentas famílias. [Os donos
do hotel] Entraram na Justiça para reaver o que era deles e aí vem um promotor
perguntando onde os proprietários vão colocar as famílias. Se fosse eu,
esqueceria a educação que meus pais me deram e daria uma resposta. Eles não
puderam fazer nada até agora. Que espécie de governo eu tenho?
RESPEITO: Quando chega alguém aqui em casa para me ajudar nos serviços domésticos, principalmente os que não sei fazer (QUASE TODOS!), sempre digo que assim como respeito o trabalho delas, é preciso que elas respeitem o meu. Ou seja, os serviços da casa são delas e são elas que resolvem o que precisam para trabalhar mais à vontade, inclusive telefonando para os lugares que poderão trazer o que for necessário. Enquanto isso, eu só leio e escrevo. Resultado: nunca tive nenhum problema com quem trabalhou comigo e ficam aqui sem reclamar de coisa alguma, se tornando, até mesmo, minhas grandes amigas.
EMPREGADAS DOMÉSTICAS são seres humanos e não podem ser tratadas como se fossem máquinas. Aliás isso serve para todos os trabalhadores. Outra coisa: Todas elas almoçam na mesa conosco, o que não fazem nas outras casas e têm direitos iguais aos nossos .
Quanto à desigualdade, ela sempre existirá. Um grande exemplo disso é a diferença que sempre existiu entre minhas duas primas e eu que fomos criadas juntas e tivemos vidas tão diferentes, desde que terminamos a escola primária. Cada uma de nós foi para outras escolas diferentes e tivemos uma vida profissional muito diferente umas das outras. De nada adiantou termos as mesmas chances e as mesmas condições, porque nem todos são iguais!
Há um horroroso hábito: quase todas as consideradas 'patroas', embora muitas nem trabalhem para pagar quem faz as coisas em sua residência, se referem às suas ajudantes como "a minha empregada", como se nenhuma delas tivesse nome.
OBS.: A Madalena , que trabalha aqui em casa, não aceitou sair numa foto em que todos a possam ver, embora seja muito bonita e tenha sua página, com foto, no FEICIBUQUI . Sem contar que ela é ainda mais bonita que o prato acima feito por ela.
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